O futuro da Advocacia é algo incerto para grande parte dos profissionais da área, no entanto, recentemente surgiram ideias que nos ajudam a compreender melhor este tema. “Advocacia 4.0” e “Advocacia 5.0” são conceitos chave para que o setor educacional possa começar a se preparar para a nova realidade do Direito.
As últimas décadas foram marcadas por diversas revoluções sociais e tecnológicas, principalmente com a chegada da internet. Na chamada quarta revolução industrial, ou “Indústria 4.0”, a promessa de inserção da internet é ainda maior, Internet das Coisas (IoT, na sigla em inglês), Inteligência Artificial (IA), Robótica, Metaverso e Blockchain são tecnologias que estão revolucionando nossos modos de vida.
O impacto desse movimento não é restrito apenas à indústria ou setores tecnológicos, ele também atinge as relações, a comunicação e tantos outros fatores humanos. Isto também ocorre com o Direito. Nesse sentido, já discutimos aqui no blog sobre alguns impactos causados pela tecnologia no ambiente jurídico, como por exemplo, o caso da relação entre o Metaverso e o Direito.
Mas afinal, o que há de novo na “Advocacia 5.0”? Qual sua origem? Estamos a caminho da quinta revolução industrial? Quais são suas diferenças em relação a “Advocacia 4.0”? Neste artigo, vamos abordar estes conceitos e proporcionar uma melhor compreensão do tema. Confira!
O que é sociedade 5.0?
O termo “Advocacia 5.0” surgiu como uma extensão para o campo do Direito de uma formulação criada pelo Japão em 2016 e apresentada na CeBIT em 2017, a chamada “Sociedade 5.0”. Este conceito foi elaborado para nortear as interações sociais frente às transformações tecnológicas dos próximos anos.
A Sociedade 5.0 é pautada pela utilização intensa das tecnologias associadas à “Indústria 4.0”, totalmente voltadas para o desenvolvimento humano. Sociedades passadas eram centradas em premissas de desenvolvimento diferentes, como por exemplo:
- Sociedade 1.0: Caça e Coleta
O início de tudo, o primeiro contato do homem com a natureza, a criação de animais e o cultivo de sua existência.
- Sociedade 2.0: Agricultura
Marcada pelo surgimento da agricultura, com pequenas cidades sendo formadas. As pessoas deixaram de ser nômades.
A partir da Primeira Revolução Industrial, momento em que são criadas as máquinas. Indústrias preenchem cidades, gerando empregos e um novo modelo de vida em sociedade.
- Sociedade 4.0: Informação
- Momento atual, com informações que chegam cada dia mais rápidas, tecnologias como IoT, Inteligência Artificial, Robótica, entre outras. Trazem troca de informações, experiências e impactam na forma como as pessoas se relacionam.
Agora, a Sociedade 5.0 surge para integrar totalmente a tecnologia ao meio ambiente e ao ser humano. Seus objetivos são claros: reduzir a desigualdade social e os problemas causados por nossa interferência na natureza, aumentar a expectativa de vida das pessoas, a produção de alimentos e meios de subsistência e fomentar ideias e projetos de impacto global.
O que é advocacia 5.0?
É justamente deste amplo movimento que nasce a Advocacia 5.0, uma elaboração que antecipa os rumos da sociedade civil e prepara o Direito para estar à frente desta transição. Isto se difere da forma como o campo Jurídico se comporta historicamente, aguardando que a sociedade se transforme para que a posteriori possa incorporar estas transformações no seu dia a dia, normatizar e legislar sobre elas.
Portanto, podemos definir a Advocacia 5.0 como um conjunto de técnicas, processos e cultura que dão suporte à inserção da tecnologia, advinda da quarta revolução industrial.
No Direito, esse movimento surge como uma ferramenta, que possibilita a realização de um trabalho mais humanizado, customizado e colaborativo. Com o foco voltado para práticas de meio ambiente, responsabilidade social e governança corporativa.
O ponto crítico, aqui, se torna compreender quais são as práticas que viabilizam a Advocacia 5.0. Para focar na humanização e customização do atendimento, é imprescindível que o advogado consiga abandonar tarefas massivas e repetitivas, e passe a se dedicar mais em compreender as reais necessidades do cliente.
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Tecnologias que possibilitam a inserção da advocacia 5.0
É neste cenário que as tecnologias disruptivas da Indústria 4.0 entram para facilitar a execução de tarefas mecânicas. Existem diversas tecnologias capazes ajudar o advogado a focar no que realmente importa, seu cliente:
- Automação de processos: automatizar processos repetitivos é a principal função do desenvolvimento dessa técnica. Hoje com o início do desenvolvimento dos softwares jurídicos, serviços que em um passado recente não se cogitava o risco de sofrerem automatizações, são agora automatizados. Nestes softwares existe a possibilidade de configurar modelos de gestão jurídica, dando mais agilidade às burocracias do setor.
- Automação de investigação jurídico-legal: Hoje em dia, através das IAs, alguns softwares do mercado, desenvolvidos por empresas chamadas de “Law Techs” ou “Legal Techs”, conseguem realizar a leitura de milhares de páginas em segundos e analisar previamente os documentos, através de Machine Learning, gerando insights para os advogados responsáveis pelo caso em trâmite.
- Jurimetria: Outra tecnologia viável através das IAs e do Big Data, é a sistematização da busca e análise de jurisprudências. Por meio de uma técnica conhecida como reconhecimento de padrões, algoritmos conseguem gerar estatísticas a partir de decisões passadas e recomendar ações para a equipe do processo.
- Plataformas de mediação: São softwares baseados em aprendizado de máquina que conseguem interpretar e analisar os interesses das partes envolvidas em um conflito, judicial ou extrajudicial, e recomendar uma solução possível que atenda a ambos.
- Infraestrutura digital: Este é um assunto importantíssimo, pois diz respeito, a todos os serviços necessários a um escritório que pretende ter suporte ao trabalho remoto e implementar as ferramentas modernas de gestão processual citadas acima. Para isto, é crucial manter segura todas as informações do escritório e de seus clientes em uma infraestrutura de nuvem (Cloud) com backups e processos de autorização e autenticação de acesso bem estabelecidos.
- Smart Contracts: Uma inovação baseada na tecnologia Blockchain, os Smart Contracts são contratos digitais entre partes interessadas, que definem direitos, responsabilidades e podem ter cláusulas de execução automática. Ainda em experimentação no mercado, podem ser utilizados em autenticações, registros e transferência de propriedade física e intelectual.
Quais são as habilidades do advogado 5.0?
Aplicando estas ferramentas no cotidiano do trabalho, o advogado poderá compreender como ele realmente entrega valor para o cliente na Sociedade 5.0. E para ajudar nessa compreensão o Fórum Econômico Mundial elencou algumas habilidades das profissões do futuro do Direito, que são também as habilidades do advogado 5.0:
- Solução de problemas Complexos
- Pensamento Crítico
- Criatividade
- Gestão de pessoas
- Relacionamento Interpessoal
- Inteligência Emocional
- Julgamento e Tomada de Decisão
- Orientação de Serviço
- Negociação
- Flexibilidade Cognitiva
O desenvolvimento de tais habilidades permite ao Advogado 5.0 abandonar a cultura da massificação dos processos e, efetivamente, inovar. O interessante desta abordagem é que podem surgir alternativas extrajudiciais que conseguem solucionar as necessidades de seus clientes.
Um bom exemplo de uma cultura voltada à solução criativa dos conflitos ocorre no sistema judiciário inglês. Advogados de processos civis tem como premissa no código de ética da Law Society apresentar ao menos três alternativas distintas de solução dos conflitos para seus clientes.
Para isto é imprescindível que os advogados adquiram um ótimo relacionamento com seu cliente e uma sinergia de valores. Isto reduz a sobrecarga do sistema judiciário e permite que o trabalho do advogado seja mais humano e menos repetitivo.
Leia também: o futuro do profissional do Direito associado às novas tecnologias e inovações
Quais as diferenças entre advocacia 5.0 e 4.0?
Apesar de ambas atuarem com a inclusão das tecnologias no cotidiano de um escritório, ou no atendimento de um cliente, a advocacia 4.0 e a advocacia 5.0 possuem uma diferença fundamental. A advocacia 4.0 entende a tecnologia como um fim, assim como vimos na Sociedade 4.0, enquanto a advocacia 5.0 a entende como um meio.
A advocacia 4.0, na sua abordagem, enfatiza a aplicação da tecnologia, marcada pela automação dos processos para ganho de produtividade, enquanto a advocacia 5.0 está atenta ao atendimento empático, na educação humanizada e na geração do valor através do relacionamento.
Assuntos que são tratados na advocacia 4.0, como por exemplo, automação de processos, utilização de Big Data e Inteligência artificial continuam vivos na advocacia 5.0. No entanto, agora o foco não está na redução das burocracias ou operações manuais e sim em como resolver problemas sociais a partir delas.
Por estes motivos vemos a advocacia 5.0 como uma evolução natural da advocacia 4.0, é o momento em que estas tecnologias se tornam maduras e precisamos aplicá-las para objetivos que abrangem as demandas da sociedade.
A pandemia de COVID-19 causou um forte avanço do uso destes sistemas. A tendência é que nos próximos anos esse processo seja ainda mais acelerado, uma vez que o desenvolvimento tecnológico tem crescimento exponencial e o mercado demanda por melhorias contínuas.
Qual a relação entre tecnologia e o Direito no Brasil?
O sistema judiciário brasileiro possui suas particularidades em comparação com outros sistemas pelo mundo. A baixa confiança na corte da primeira instância e grande número de recursos é apenas um dos fatores que causa um aumento do tempo de baixa de casos.
Segundo o relatório World Justice Project: Rule of Law Index 2021 o Brasil figura a 77ª posição no ranking geral entre 139 países. O indicador mede nove fatores, como por exemplo: restrições aos poderes do governo, justiça civil, justiça criminal, ausência de corrupção, entre outros.
O desempenho do país nos mostra que existem inúmeras oportunidades de melhoria e as novas tecnologias que surgiram são poderosas aliados para a modernização do sistema de justiça nacional.
Um projeto apresentado recentemente pelo CNJ é o programa Justiça 4.0, que visa trazer mais eficiência e transparência ao poder judiciário. O painel de estatísticas é apenas uma das iniciativas em curso, para que a justiça brasileira seja modernizada.
Na advocacia, os modelos de trabalho híbrido e home office se tornaram uma realidade. Estudos apontam que houve um aumento de produtividade em grandes bancas que adotaram o modelo de maneira definitiva.
As tendências da Advocacia 5.0
Cada vez mais os softwares jurídicos ganham espaço no mercado e conseguem tornar mais ágeis tarefas de rotina. O problema gira em torno do alto custo de implementação, o que tende a restringir o acesso a essa tecnologia.
Quando vamos tratar de atendimento, o que notamos é que técnicas de Marketing e letramento Digital ganham espaço, advogados estão cada vez mais presentes nas mídias sociais para que consigam captar clientes em diversas frentes. Este tipo de atuação consegue quebrar antigos paradigmas, desta que é uma das profissões mais tradicionais.
E percebemos que há mais espaço, técnicas de Visual Law vêm sendo utilizadas inclusive para simplificar a linguagem de contratos e documentos. Infográficos, tabelas, imagens, cores, são inseridos para facilitar a compreensão dos documentos.
No cenário brasileiro essa transformação digital é imprescindível para que nossa justiça seja mais simples e eficiente. Dessa forma, as mudanças garantem que os profissionais consigam se manter atualizados no Direito e saibam fazer uso das inovações para entregar um trabalho mais qualificado.
Advocacia 5.0 na educação
É muito importante que os gestores da educação e o corpo docente estejam sempre atualizados em relação às novidades no mundo do Direito. Assim, é possível que os gestores avaliem as tendências da educacionais e consigam levá-las para sua instituição de educação superior (IES).
Adaptar as metodologias de ensino na mesma velocidade do desenvolvimento tecnológico é um grande desafio para as instituições. Adotar uma cultura ágil em sua gestão é muito importante quando tratamos destes ajustes de rota.
Isto pode oferecer maior flexibilidade para as IES, facilitando a implementação de novas tecnologias dentro e fora da sala de aula. Com objetivos bem definidos, se torna uma questão de planejamento estratégico definir quais são as técnicas que irão agregar mais valor ao aluno.
Adotar metodologias ativas com uso de tecnologias digitais proporciona o desenvolvimento da autonomia do aluno e a personalização do processo de aprendizagem. Essas práticas contribuem para que o alunos esteja no centro do processo de ensino/aprendizagem.
Como trabalhar Advocacia 5.0 na sua IES
Incentivar a constante atualização do corpo docente sobre a tecnologia mostra-se fundamental, pois os educadores precisam estar alinhados com o propósito da instituição. Nesse sentido, a disponibilização de conteúdos de autores que falam sobre a tecnologia na educação é uma excelente estratégia.
Organizar bootcamps, webinários, workshops com empresas que já utilizam as ferramentas mais modernas para o mundo jurídico e capacitar os alunos nessas técnicas para que cheguem no mercado de trabalho com uma formação mais sólida.
Em última instância pode-se pensar na criação de uma matéria específica, para lidar com estes temas, e inseri-la no projeto pedagógico do curso. Uma ótima base para a construção desse projeto são justamente “as habilidades do profissional do futuro” elencada pelo fórum econômico mundial.
Esperamos que este artigo tenha te ajudado a compreender os diversos desdobramentos da advocacia 5.0, e como estas tecnologias podem contribuir com o futuro do direito. Para identificar outros pontos de melhoria no processo de ensino, confira 8 dicas sobre como se manter atualizado no Direito!