Inovar ou se renovar se tornou fundamental para sobrevivência e o crescimento sustentável das Instituições de Ensino Superior (IES) para ter alto impacto nas estratégias de gestão acadêmica, alinhadas às necessidades do mercado.
Mas como gestores podem desenvolver a criatividade e estimular inovações nas IES, engajando estudantes, docentes e demais membros da comunidade acadêmica para atender as necessidades do mercado?
Quais as competências essenciais que líderes e gestores das IES devem desenvolver para engajar suas equipes, estudantes e toda a comunidade acadêmica, para ofertar mão de obra qualificada que atenda à demanda do mercado?
Ainda hoje, vemos que as IES e as organizações que compõem o mercado de trabalho são parecidas com silos independentes, onde há falta de comunicação e transversalidade nos processos de formação profissional.
Foco no mercado
Muito tempo atrás, em um simpósio para professores de ensino superior de química, apresentei o perfil profissional para atender às necessidades das empresas químicas e petroquímicas.
Comecei apresentando o resultado de uma pesquisa, que entre outras informações, indicava que cerca de 80% das demissões voluntárias nas empresas se davam por razões comportamentais e não técnicas.
Uma professora fez uma intervenção que deixou todos os presentes em estado de reflexão profunda. Ela mencionou que toda a grade escolar era formada por disciplinas iminentemente técnicas e, vendo que o fator de maior sucesso profissional nas empresas era o comportamento dos profissionais, ela concluía que, no limite, estava formando estudantes para o insucesso profissional.
As competências comportamentais são críticas para o sucesso profissional dos estudantes, mas não costumam ser aprendidas nas IES. Por exemplo, em que disciplina o estudante aprende a dar e receber feedback estruturado? E a prática do feedback é um fundamento importante na comunicação eficaz entre líderes e liderados nas organizações.
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Nesse contexto, o que deveria ser uma troca de conhecimento entre as IES e os estudantes acaba condicionada por ambos pelo hábito da relação hierárquica de transmissão do conhecimento; ex.: professor para aluno, chefe para subordinado, em que o líder despeja seu conhecimento (às vezes defasado do mercado) sobre o liderado e despreza a sua necessidade e contribuição na formação contínua de ambos.
Desenvolver liderança inovadora nas IES pode colaborar efetivamente para enfrentar esse desafio, incentivando o diálogo contínuo com as partes interessadas (docentes, estudantes, membros da comunidade acadêmica, acionistas, mercado, fornecedores, sociedade, etc.) sobre a necessidade de a instituição inovar / se renovar, e que seja um valor compartilhado internamente e percebido por essas, bem como esteja relacionado com a paixão e a visão de futuro dos líderes e gestores das IES, e não com a posição hierárquica que ocupam nessas instituições.
Liderança Inovadora nas IES
Para criar uma liderança inovadora nas IES, deve-se buscar desenvolver na instituição uma combinação de estilos de liderança empreendedora, transformacional, carismática e participativa.
Quando as instituições são criadas, quase sempre seus fundadores formam a cultura organizacional com um motivo poderoso, uma visão clara e com uma liderança empreendedora, que impulsiona a organização e cria valor para as partes interessadas.
Os estilos de liderança transformacional e participativa são principalmente adequados para obter uma transformação cultural inovadora, em que a liderança costuma usar o poder, embora com moderação e não com uma atitude autocrática.
Esses líderes costumam usar o poder para articular problemas, indicar limites, romper barreiras, trocar pessoas e criar espaço para inovação na instituição, mas não visam aumentar sua própria posição de poder. Costumam exercer a posição de poder, mas agem de forma transformacional, envolvendo outras pessoas para desenvolver um ambiente organizacional fértil à inovação / renovação.
Líderes inovadores, quando criam as instituições, têm qualidades de líderes empreendedores e começam as atividades acadêmicas com uma ideia inovadora.
Já quando atuam em instituições existentes, costumam ser carismáticos, trabalham de forma transformacional, dão sentido às ações da organização e são autênticos.
O principal papel da liderança inovadora nas IES deve consistir precipuamente em atrair, mobilizar, desenvolver e reconhecer os talentos da instituição com o objetivo de cocriar novos processos, produtos e serviços, com foco nas necessidades do mercado.
Tais líderes devem encorajar novas ideias e assumir os riscos dessas ideias, formar equipes com base na diversidade das pessoas, criar relações de confiança, gerenciar bem os conflitos, saber delegar tarefas de acordo com o nível de competência das pessoas, incentivar e apoiar o trabalho em equipe de alta performance.
Líderes inovadores de uma IES devem procurar identificar e atender à necessidade das partes interessadas e devem ser capazes de:
- Atrair e desenvolver pessoas que compartilham seu sonho e paixão de realizar algo novo, a visão de futuro da instituição, e estar preparados e dispostos a apoiar suas iniciativas;
- Expressar a visão e o sentindo da missão claramente, estimulando o orgulho, ganhando respeito e confiança das partes interessadas;
- Comunicar suas altas expectativas, utilizar símbolos para focar os esforços, expressar propósitos importantes de maneira simples;
- Estimular a inteligência emocional e intelectual na organização, a troca de conhecimento dentro e no entorno da instituição e o cuidado na solução dos problemas;
- Dar atenção personalizada, aconselhar docentes, estudantes e demais membros da comunidade acadêmica;
- Ser acessível, pedir feedback e não ter medo de trazer à tona as emoções para serem discutidas;
- Conhecer os próprios pontos fortes e fracos e saber pedir ajuda aos outros para superar os pontos fracos.
Modelo Septagrama dos Líderes Inovadores (MSLI)
O Modelo Septagrama dos Líderes Inovadores—MSLI— (Brillo e Boonstra, 2018) revela como as organizações de sucesso implementam inovações sustentáveis e quais os modelos mentais que líderes bem sucedidos desenvolvem para fazer a inovação acontecer nas suas organizações.
A Figura a seguir ilustra o MSLI, que é composto por 7 mentalidades fundamentais que pode servir para o desenvolvimento da liderança inovadora nas IES.
Mentalidade Estratégica
A mudança cultural mexe com os sentimentos das pessoas. Quando as situações são incertas, elas costumam buscar informações e significados para poder interpretá-las. O significado dá cor à situação e à direção do comportamento das pessoas.
Quando a sobrevivência da instituição está em jogo, costuma gerar incerteza, que às vezes pode ter um efeito paralisante na organização.
Uma liderança inovadora costuma tomar a iniciativa em tais casos – interpretando a situação e mostrando o caminho a seguir – oferece uma nova perspectiva sobre a situação existente e o futuro.
É assim que uma liderança inovadora nas IES pode inspirar outras a se juntarem a ela nesse curso, aproveitarem o novo futuro, fazendo a diferença em situações incertas, devendo ser capazes de:
- Ter disposição para desenvolver e manter redes internas e externas de incentivadores das estratégias da instituição e envolver as partes interessadas no andamento dessas estratégias;
- Reconher situações pouco claras, a incerteza que isso pode causar e dar significado a elas, comunicando, de forma aberta e honesta, o real estado das coisas;
- Acreditar que um novo futuro possa ser alcançado por meio de um esforço conjunto e que sempre é preciso pedir ajuda aos outros para que pensem juntos sobre um panorama novo e desejável para o futuro;
- Gostar de inspirar as pessoas sobre o ponto de vista do significado comum na organização, do valor para as partes interessadas e dos valores fundamentais da instituição;
- Ter uma visão atraente do futuro, inspirar as pessoas para enxergarem esse futuro e dar direção estratégica contando histórias atraentes sobre o “novo mundo”.
Mentalidade Política
Muitos interesses estão ativos dentro e ao redor das IES. Os acionistas são importantes para a continuidade financeira e os estudantes fiéis são essenciais para a estabilidade e sustentabilidade das instituições.
Concorrentes, novos entrantes e substitutos podem ameaçar o modelo institucional e desafiar a organização a inovar.
Políticos e autoridades influenciam as atividades acadêmicas expressando opiniões e desenvolvendo novas leis e normas.
Para qualificar a instituição para o futuro torna-se essencial analisar as forças e pressões dos interesses que a influenciam. As partes interessadas também contribuem para as dinâmicas dos processos dentro das IES.
Nesse sentido, líderes inovadores nas IES devem:
- Criar uma visão geral dos interesses e das posições de poder das partes interessadas dentro e ao redor da instituição;
- Ter disposição para formar uma coalizão de pessoas dentro e fora da organização que apoiem a mudança e queiram participar dela;
- Formar amplas redes de relacionamento para fomentar iniciativas inovadoras e servir de modelo positivo para os componentes dessas redes;
- Obter comprometimento e suporte para mudança, vindos de todos os tipos e de todas as partes envolvidas dentro e fora da instituição;
- Tomar decisão de forma clara e percebida pelas partes interessadas como justa. Deve ser clara também o que essa decisão significa para as pessoas e o que se espera delas em função dessa decisão.
Mentalidade Transformacional
Líderes inovadores em mudanças culturais nas IES devem promover inovações formulando uma visão desafiadora e ser capazes de motivar os outros com essa visão.
Para alcançar essas mudanças culturais, tais líderes formam coalizões vitais com pessoas que querem desempenhar um papel de liderança nessa visão e formam equipes inovadoras, que desafiam os conceitos existentes na organização.
Líderes transformacionais visualizam o futuro. Essa visão reflete o significado da organização e deixa claro o que ela defende e a mensagem que transmite.
A força da instituição também pode ter mais visibilidade nessa visão. Uma visão motivadora costuma dar significado ao trabalho das pessoas, faz com que elas sintam orgulho da organização e descreve o significado da instituição para as partes interessadas.
Líderes inovadores nas IES que desenvolvem uma visão inspiradora devem:
- Levar em consideração os valores e as opiniões e identificar pessoas-chave para enriquecer e promover a visão de futuro da instituição;
- Reconhecer as forças positivas e negativas que estão presentes na organização e procurar atender às necessidades das pessoas para que a visão possa ter significado para elas;
- Fortalecer a identidade da instituição e conectar as pessoas com os valores compartilhados nela;
- Comunicar claramente com as partes interessadas no sentido de mostrar quem é realmente a instituição;
- Compartilhar a visão do ambiente da organização, ter a capacidade de formular estratégias de inovação e de atrair e desenvolver pessoas para formar uma equipe vencedora.
Mentalidade Apreciativa
Líderes em mudanças culturais e em inovações nas IES devem ter consciência do passado e reconhecer as contribuições de seus antecessores.
Tais lideranças devem saber como valorizar as pessoas pela forma como contribuem para a instituição. Devem envolver os outros a participar da mudança cultural, abrir espaço para emoções e ser honestos em dizer como a mudança vai afetar a vida das pessoas.
Também devem procurar desenvolver relações de confiança e apreciar as diferenças de pontos de vista das pessoas, porque creem que essas diferenças podem ser uma fonte contínua de renovação.
Uma liderança inovadora em uma IES deve apreciar a diferença entre as pessoas e a diversidade delas, desenvolver relações de confiança e abrir espaço para diálogo sobre os valores culturais da instituição, que implica em:
- Fazer perguntas apreciativas, como por exemplo: aual foi a inovação mais importante da instituição e como nós podemos aproveitar essa experiência para desenvolver inovações bem-sucedidas?
- Acreditar na capacidade das pessoas de iniciar e realizar inovações que ajudam a organização a se qualificar para o futuro;
- Conhecer e apreciar as diferentes competências das pessoas e formar equipes com perfis variados;
- Construir relações de confiança com docentes, estudantes e demais membros da comunidade acadêmica, sendo acessível e honesto sobre sentimentos e emoções;
- Vivenciar os valores que prega e apoiar efetivamente as iniciativas das pessoas nos processos de mudança.
Mentalidade Experencial
Essa mentalidade é sobre experimentar a inovação/renovação nas IES, tornando os resultados visíveis, aceitando e aprendendo com os erros e compartilhando ricas experiências.
As pessoas aprendem com os eventos críticos e com os erros cometidos. Essas experiências de aprendizagem formam a cultura da instituição, porque vivenciando tais situações as pessoas aprendem a lidar com eventos inesperados.
A ideia por trás disso é que as pessoas que aprendem nas organizações, normalmente são curiosas e estão dispostas a experimentar. Experimentar e aprender pode levar pessoas de diferentes origens a compartilhar espontaneamente seus conhecimentos e vibrar com o sucesso mútuo.
Nesse sentido, uma liderança inovadora numa IES deve ser capaz de:
- Construir uma visão compartilhada e prática para prospectar visões compartilhadas do futuro, que promovam o compromisso e o envolvimento das pessoas, em vez de conformidade;
- Questionar os modelos mentais e pressupostos básicos que condicionam a forma de entender o mundo e de agir diante de incertezas;
- Tornar visíveis os resultados, fornecendo feedback à equipe, compartilhando histórias e celebrando os sucessos alcançados;
- Ter consciência dos efeitos do seu comportamento sobre os outros e se dispor a discuti-lo abertamente e a refletir sobre os seus modelos mentais e as limitações deles.
Mentalidade Ativa
Inovação sem implementação efetiva é um devaneio, e a implementação da inovação sem uma visão estratégica é um pesadelo.
Líderes inovadores numa IES devem ter uma orientação para a ação. Tais líderes devem querer alcançar resultados e estão empenhados em realizar mudanças profundas. Tomam a iniciativa de mudar sua instituição, descobrindo que há muitos tipos possíveis de intervenção nos processos de mudança.
As intervenções são ferramentas utilizadas e atividades essenciais para realizar a ambição da mudança. O estado da arte das intervenções nos processos de mudança consiste numa combinação coerente, abrangendo o desenvolvimento de um plano de ação, o motivo da mudança e a estratégia de mudança para realizar a inovação, que compreende:
- Compartilhar uma ambição que guia suas ações e se motivar a fazer intervenções para realizar a mudança e para experimentar ativamente novas práticas de trabalho;
- Ter iniciativa e concentrar energia em torno das coisas que precisam mudar;
- Envolver as partes interessadas a trabalharem juntas nos desafios para fazer a mudança acontecer na instituição;
- Estar consciente da influência que exercem e da posição que ocupam na instituição, bem como deixar claro porque fazem certas escolhas e estabelecem prioridades alinhadas com os valores que proclamam;
- Demonstrar comportamento exemplar, serem visíveis, fazerem o que dizem e representarem um modelo positivo a ser seguido pelos outros.
Mentalidade Reflexiva
Uma liderança inovadora em mudanças culturais numa IES deve estar consciente das dinâmicas dentro e no entorno da instituição, e deve saber efetivamente o que está acontecendo dentro e no entorno da organização.
Tal liderança se conhece e estuda os outros com profundidade. Usa essa consciência para direcionar a energia das pessoas na instituição e realizar inovações.
Durante a mudança cultural, as tensões nos processos de inovação costumam ser óbvias e parte integrante da dinâmica organizacional.
Geralmente, essas tensões costumam ajudar a descobrir as regras não escritas da instituição e as dinâmicas subjacentes que orientam o comportamento das pessoas.
A mudança profunda coloca os valores, os hábitos e as formas de conduta existentes sob pressão, e podem surgir tensões e conflitos, que podem ser uma fonte criativa de renovação de valores mais profundos.
Nesse sentido, para desenvolver uma mentalidade reflexiva, uma liderança inovadora numa IES deve:
- Conversar informalmente com as partes interessadas para saber o que os preocupa e situações específicas que podem dar algum sinal de como as coisas estão indo;
- Pesquisar sobre motivação e necessidades sociais e emocionais das pessoas e analisar as situações específicas para descobrir padrões culturais existentes que possam contribuir para mudanças profundas;
- Desenvolver uma antena social potente e ter consciência da sua trajetória, dos momentos importantes da sua vida e da sua carreira;
- Saber bem o que lhe dá energia e quais são as suas ambições e fontes de inspiração, conhecer seus pontos cegos e fracos e saber como compensá-los;
- Ser acessível, não ter medo de tornar suas emoções visíveis e objeto de discussões.
Acredito que para desenvolver uma liderança inovadora nas IES é necessário ter paixão por renovação/inovação dentro e no entorno das instituições, para ter ideias criativas para se autodesenvolver, arregaçar as mangas e colocar em prática essas ideias nas suas organizações.
Espero que tais líderes tenham motivos e oportunidades para inovar/renovar na sua instituição, fazendo coisas de forma diferente, melhor e com valor econômico, desenvolvendo junto com as partes interessadas novos processos, produtos e serviços para ofertar mão de obra qualificada que atenda à demanda do mercado.
Gostaria de enfatizar que querer inovar ou se renovar não deve ser um objetivo em si, mas sim uma estratégia das IES, para evoluir como um processo contínuo e obter êxito com ou apesar das circunstâncias do ambiente institucional.
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Referências
Brillo, J., Boonstra, J. (2018) Liderança e Cultura Organizacional para Inovação, Editora Saraiva.
Brillo, J. (2020) Liderança Inovadora: como se destacar em ambientes de mudanças, Editora Expressa / Saraiva educação.