O planejamento das atividades é parte do dia-a-dia da maioria dos profissionais. Mesmo sem perceber, há uma ordenação para a execução de tarefas simples. De fazer um café a levantar uma casa, o planejamento é o que conecta o profissional aos seus propósitos e intenções, ou seja, aos objetivos daquela ação.
O medo de ficar engessado em uma rotina faz com que muitas pessoas abram mão de um planejamento prévio. Na verdade, muitas delas não estruturam sua rotina ou seu processo, mas acabam seguindo alguma forma de ordenação.
Um dos gargalos educacionais do país está ligado à necessidade de fazer com que os professores tenham momentos e recursos para realizar planejamentos. Além dos momentos em sala de aula, eles precisam observar os dados coletados para traçar o melhor caminho de ensino.
Seja na elaboração do currículo de uma turma, na preparação de uma prova ou na ordenação dos conteúdos de uma disciplina, os profissionais da educação sempre estão em contato com o planejamento.
Existem várias formas de fazê-lo. Algumas delas ainda conseguem prever certo espaço para a espontaneidade e uma maior abertura para que o planejamento seja repensado de acordo com o desejo ou necessidade das turmas e desses profissionais.
Se há interesse em atingir determinado objetivo, a forma poderá ser repensada no percurso. O planejamento auxilia o professor e a instituição de ensino superior a enxergar a própria adesão a essas metas, com maior clareza e adequação.
Quer saber mais sobre esse assunto? Que tal conhecer um pouco mais sobre um modo diferente de fazer o planejamento? Continue essa leitura e descubra um novo modo de se organizar com o planejamento reverso!
O que é planejamento reverso?
O planejamento reverso é uma tradução do termo Backward Design, dos autores Grant Wiggins e Jay McTighe. A ideia é bem literal, basicamente é começar o planejamento pelo fim. No caso da educação, os alunos precisam ter contato com o lugar onde querem chegar para, a partir daí, criar os passos que serão necessários para alcançar esse espaço.
Além dos alunos, os próprios professores são encorajados a fazer esse tipo de planejamento, com as metas coletivas das turmas e das instituições de educação superior (IES) e com seus objetivos individuais.
Saber onde é necessário chegar e o por quê disso é o que auxilia o “planejador” e os envolvidos no planejamento a ter uma compreensão mais ampla do processo necessário para atingir os objetivos.
Segundo Grant Wiggins e Jay McTighe, pensar os objetivos antes de pensar os métodos pode ajudar o planejador, e as outras pessoas envolvidas no planejamento, a evitar erros e potencializar os acertos no processo de ensino-aprendizagem.
Para deixar ainda mais claro, preparamos um passo a passo para realizar um planejamento reverso. Confira!
Como fazer o planejamento reverso?
A criação de um planejamento reverso deve obedecer a alguns critérios. Um deles são as etapas desse processo. Dessa forma, é possível criar um controle de qualidade da estruturação da jornada de ensino-aprendizagem.
O planejamento reverso deve seguir três estágios, com conjunto de padrões em cada uma dessas etapas. Eles podem se manifestar através de perguntas que o planejador deve fazer para alcançar seus objetivos, como veremos mais à frente.
Quer melhorar o desempenho acadêmico em suas aulas, ou na sua IES? O planejamento reverso pode ajudar nessa tarefa! Para compreender como colocar esse conceito em prática, siga essas três etapas:
1. Identifique e defina os objetivos
Essa é a primeira etapa do planejamento reverso. Nela, os objetivos do processo de ensino-aprendizagem são definidos a partir de um estudo do que é mais relevante dentro daquele contexto.
Por vezes o objetivo vai estar ligado ao domínio de um conceito que será necessário para operacionalizar outros conhecimentos. Em outras oportunidades, estará conectado à necessidade de dominar uma prática.
A primeira dica para identificar o objetivo é pensar o verbo que o define. O verbo irá definir a ação necessária para alcançar os resultados. Exemplos de verbos, nesse caso, podem ser “analisar”, “compreender”, “identificar”, “aplicar”, etc.
Logo após o verbo virá o complemento contextual, que dá ao planejamento mais recursos para ser aplicado. Algumas das perguntas padrão que podem ser feitas neste estágio são:
- Quais os resultados esperados?
- O que quero aprender ou ensinar?
- O que é imprescindível aprender sobre esse assunto?
- O que será necessário aprender agora para compreender outros conceitos?
- O que é preciso saber fazer após adquirir esse conhecimento?
- O que pode ser difícil de compreender?
Nessa etapa é preciso considerar alguns fatores externos como as diretrizes curriculares nacionais do ensino superior, questões contextuais dos alunos ou da IES e até mesmo o conhecimento, interesse e especialização do educador.
2. Escolha as evidências
Essa é uma etapa de verificação do processo de aprendizado do aluno. Nela, é possível observar a interface dos alunos com os conteúdos para compreender pontos de melhoria, além dos pontos fortes dos alunos e turmas.
Na etapa de coleta de evidências é preciso saber o que buscar, já que é possível observar os métodos com maior potencial de engajamento, além da forma como os estudantes relacionam o conteúdo com seu contexto, entre outros fatores.
Nesse segundo passo é interessante criar atividades com intuito de coletar esses dados de interesse, direcionando o caminho a partir do objetivo pré-definido.
Dessa forma, o planejador torna-se um avaliador potencial, que poderá direcionar o caminho de aprendizado a partir da previsão dos métodos avaliativos e questões que poderão ser abordadas naquele tópico ou curso.
Isso cria uma correlação entre as primeiras fases de planejamento reverso e aquela em que será necessário escolher a forma de repassar o conteúdo. Para a coleta das evidências precisamos responder algumas questões padrão, seguem algumas sugestões:
- Qual a melhor forma de saber se os alunos atingiram os objetivos até então?
- O que pode comprovar a proficiência dos alunos?
- O que precisará ser avaliado nesse tópico ou curso?
- Quais tarefas podem demonstrar a compreensão do assunto?
- Quais são os critérios ligados às evidências coletadas para determinar a compreensão dos alunos?
- Como promover autoavaliação do aluno e reflexão sobre a própria aprendizagem?
3. Planeje a experiência
As primeiras etapas delimitam o seu objetivo e os critérios para alcançá-lo. A partir disso, já há recursos suficientes para traçar o plano de ação do planejamento, com a delimitação do modo de funcionamento da experiência.
Muitos educadores utilizam essa etapa como início do planejamento tradicional. Porém, no planejamento reverso esse é um passo que carrega uma série de informações de relevância para a qualidade do trabalho desempenhado.
Aqui é delimitado o conteúdo a ser trabalhado e os métodos a serem utilizados, de forma que seja possível promover uma experiência de aprendizado que fortaleça o protagonismo do estudante, com interação entre alunos e com o conteúdo.
Depois da aplicação dos métodos, é recomendada a avaliação do objetivo, se foi alcançado parcialmente ou em sua totalidade. Após essa etapa, os dados coletados também permitem uma adequação dos pontos de melhoria que foram notados após a aplicação completa do planejamento reverso.
As perguntas padrão que podem perpassar esse momento são:
- O que é preciso ensinar/aprender para alcançar o objetivo?
- Quais habilidades serão desenvolvidas a partir dessa experiência?
- Quais são os processos e métodos necessários nessa jornada?
- Quais recursos disponíveis e necessários para atingir os objetivos?
Como o planejamento reverso se relaciona com as DCNs?
As Diretrizes Curriculares Nacionais do ensino superior (DCNs) são um conjunto de instruções que orientam a educação no Brasil, estabelecendo as bases para a elaboração dos currículos acadêmicos.
Este é um instrumento importante, que tem o objetivo de garantir a qualidade e a uniformidade do ensino em todo o país, determinando conteúdos que obrigatoriamente deverão ser vistos em todas as IES.
O planejamento reverso precisa estar em conformidade com as DCNs, sempre observando o que elas determinam em cada curso. A IES não pode apostar em uma metodologia que não respeite o que é previsto para o currículo acadêmico da graduação, devendo partir disso para estabelecer seu plano de aula com metodologia ativa.
Assim, as DCNs formam uma importante ferramenta que deve ser conferida antes de criar um planejamento reverso.
A seguir, observe os pontos em que os dois se encontram:
- Definição de objetivos e competências;
- Orientação para o currículo;
- Escolha de estratégias de ensino e avaliação;
- Personalização e contextualização;
- Avaliação e melhoria contínua.
Entenda:
1. Definição de objetivos e competências
Já na primeira etapa do planejamento reverso, a definição dos objetivos do processo de ensino-aprendizagem, as DCNs precisam ser observadas.
Como elas estabelecem as metas gerais da educação, as competências que os alunos devem desenvolver e os princípios que orientam a educação no país, o documento é fundamental para construir qualquer prática para a sala de aula.
A etapa da definição de objetivos é a principal na qual se deve observar as DCNs, tendo uma relação inerente entre a metodologia e as diretrizes. O documento oferece uma visão ampla do que se espera que os estudantes alcancem ao longo de sua trajetória educacional.
2. Orientação para o currículo
As DCNs fornecem diretivas sobre como os currículos acadêmicos – de cada curso – devem ser estruturados e organizados. Elas definem áreas de conhecimento, temas transversais e componentes curriculares que devem estar presentes no ensino.
3. Escolha de estratégias de ensino e avaliação
De forma oposta, o planejamento reverso pode ser a solução que os educadores utilizam para criar planos de ensino específicos que atendam aos objetivos e competências das DCNs.
Eles decidem quais estratégias de ensino serão mais eficazes para ajudar os alunos a alcançar essas metas, e como as avaliações serão usadas para medir o progresso dos alunos.
4. Personalização e contextualização
O planejamento reverso permite que os educadores adaptem o currículo às necessidades e características específicas de seus alunos e de seus contextos.
Isso é importante, uma vez que as DCNs fornecem uma estrutura geral que pode ser personalizada para atender às realidades individuais, indo ao encontro da personalização do ensino.
Com um ensino personalizado, que compreende as demandas, pontos fracos e fortes de cada estudante, a IES ganha em:
- Engajamento dos alunos;
- Colaboração nas aulas;
- Desenvolvimento de habilidades e competências;
- Adaptação do aluno à IES;
- Otimização do processo de ensino-aprendizagem; e
- Melhora na relação entre professor e aluno.
Leia também: O que é aprendizagem personalizada?
5. Avaliação e melhoria contínua
O planejamento reverso também envolve a avaliação contínua dos resultados de aprendizagem dos alunos e isso, é claro, tem total relação aos objetivos das DCNs.
Com base nessa avaliação, os educadores podem fazer ajustes em seus planos de ensino e estratégias para melhorar a qualidade da educação, sempre se atentando ao que tem dado certo e o que pode melhorar.
Quais são as características do planejamento reverso?
Agora que você já conhece as etapas necessárias para a realização de um planejamento reverso, que tal conhecer suas principais características?
A primeira delas é que esse é um método que aplica a teoria da aprendizagem significativa, ou seja, tem uma forte base no ensino relacional, em que o contexto dos alunos é parte essencial do sucesso da jornada de ensino-aprendizagem.
Como segunda característica, podemos citar a centralidade do estudante. Nenhuma das atividades e dos métodos de ensino reforçam o papel de protagonista do professor. Todas as etapas do planejamento devem passar pela experiência do aluno, com influência direta de sua autonomia nesse processo.
O ponto de partida do processo de ensino é o objetivo. Esqueça os modos de fazer tradicionais e as fórmulas prontas. Muitos professores utilizam planejamentos prontos para lecionarem disciplinas. Nesse caso, sobressai o modo como todos fazem em relação ao pleno aprendizado do estudante.
Isso faz com que o professor saia da zona de conforto, deixando de utilizar bibliografias, métodos e atividades em que se sente mais confiante, passando a adotar aquilo que é mais lógico para as metas pretendidas.
Os materiais utilizados em sala de aula tornam-se, dessa forma, parte do processo de aprendizagem, contextualizado ao objetivo de compreensão daquele conteúdo, e não apenas porque é algo que “todos deveriam ler”.
Logo, nessa modalidade de planejamento não é possível seguir um material didático pré-definido, já que muitos deles preveem um calendário que está atrelado ao índice proposto pelos autores.
Aprender, para o planejamento reverso, vai muito além de realizar atividades. O aprendizado não se dá pelo cumprimento dessas etapas, mas no entendimento de como aquela tarefa irá colaborar para que haja compreensão.
Outro ponto importante é que a auto reflexão dos alunos é encorajada e necessária. Eles precisam conseguir observar sua atuação diante de pontos centrais, como o objetivo traçado, ideias potenciais relacionadas ao conteúdo, como isso se relaciona com a sua formação, etc.
Qual a importância do planejamento reverso?
Quais são as principais vantagens de aplicar esse método de planejamento em sua IES? O primeiro que podemos citar é a certeza do lugar em que os alunos ocupam em relação ao processo de compreensão de algum conceito.
Além disso, é uma oportunidade da ampliação do diálogo e da relação entre professores e alunos, com o compartilhamento da responsabilidade pela jornada de ensino-aprendizagem de sucesso. Afinal de contas, autoavaliação e a adesão às metas fazem parte da rotina de ambos.
Com o planejamento reverso o aluno se sente mais resguardado, já que sabe o caminho que está tomando na busca pela compreensão de um conceito e/ou aplicação prática de algo que será necessário em sua profissão.
O planejamento reverso também conecta a IES a uma metodologia mais recente, pensada para as necessidades contemporâneas, já que o método é referência em várias instituições de ensino superior.
Essa metodologia também é importante para estabelecer uma cultura de intencionalidade nas instituições. A atuação lógica é, nesse contexto, uma forma de reafirmar que acima de gostos pessoais e preferências coletivas, há o compromisso com o estudante.
Através do compartilhamento do planejamento traçado, o professor pode difundir a prática entre os estudantes, com a possibilidade de que essa se torne uma estrutura replicável em seu caminho acadêmico e profissional.
Com um maior nível de compreensão do conteúdo proposto, os estudantes podem colher melhores resultados, o que aumenta o moral individual e coletivo, inclusive dos professores, que poderão observar seus esforços fazendo a diferença.
Exemplo de planejamento reverso
Agora que você já sabe o que é um planejamento reverso, como fazê-lo, qual sua estrutura, características e benefícios, que tal conhecer uma aplicação prática desse método de estruturação do processo de ensino-aprendizagem?
Aqui exemplificaremos a partir de uma aula de direito civil. Inicialmente é preciso definir os objetivos deste planejamento. No caso, nosso foco será “ambientar-se às audiências da vara da família”.
Se fossemos responder às questões que indicamos no primeiro passo do planejamento reverso teríamos essa estrutura inicial:
- Os resultados esperados estão ligados à ambientação aos espaços jurídicos, tanto no linguajar e jargões utilizados, quanto na estrutura de uma audiência da vara da família.
- Nessa experiência os alunos devem aprender sobre como se portar em uma audiência desse tipo, com o entendimento da estrutura que rege um evento como esse.
- Para que isso seja possível, é preciso conhecer uma base jurídica.
- Pode ser difícil compreender como transpor a parte teórica do direito para a prática de uma audiência.
Em seguida, é necessário compreender como validar o conhecimento que será adquirido. Se há uma dimensão prática e uma teórica, a forma de avaliar os estudantes deve contemplar esses dois fatores.
Aqui, o planejador precisa pensar que a compreensão do assunto pode estar relacionada a uma tarefa oral, uma comportamental e uma discursiva, mas escrita. Logo, as evidências de compreensão podem ser avaliações e autoavaliações finais, além da observação de participação.
Como terceiro passo é preciso pensar a metodologia a ser empregada. É preciso que os alunos saibam se orientar a partir de uma base teórica, que no caso pode ser representada pelo código civil.
Além disso, é preciso ter uma experiência prática de organização da audiência para que seja mais fácil assimilar todos os papéis de quem atua nesse contexto. Logo, uma metodologia que poderia ser empregada é a criação de um júri simulado.
A partir dessa prática os alunos poderão ter contato com um caso que tenha alto nível de semelhança com a realidade, fazendo com que a base teórica seja operacionalizada, na delimitação do motivo da audiência.
Também funcionaria como um exercício para uma dimensão prática e comportamental, ambientando os alunos a essa realidade.
Agora que você já conhece e sabe como aplicar o planejamento reverso em sua prática profissional, que tal conhecer 12 dicas de melhoria da experiência do aluno?