Manter uma boa saúde mental dos estudantes na graduação pode representar um grande desafio.
A necessidade recorrente de conciliar aulas e projetos acadêmicos com trabalho e vida pessoal, principalmente em cursos que demandam dedicação considerável — como o curso de Direito —, exige esforço e atenção dos alunos.
Recentemente, uma mulher forçou a abertura de uma janela e se atirou durante a realização da prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no município de Sorocaba (SP).
A OAB de Sorocaba confirmou o fato ao Portal Yahoo e explicou que a candidata não sofreu ferimentos graves. Ela caiu sobre um telhado, abaixo do local de onde se jogou.
O presidente da entidade na cidade paulista, Márcio Leme, relatou que o ocorrido se deu no segundo andar do Colégio Objetivo. Quinze minutos antes do horário de início da prova, enquanto as instruções eram lidas, a mulher se levantou da sua cadeira e andou em direção à janela.
Aparentando bastante nervosismo, ela tirou outras cadeiras do caminho, forçou a abertura da janela e se atirou.
Felizmente, ela se manteve consciente durante todo o período de resgate, realizado pelos bombeiros. Foi encaminhada a um hospital da região e não teve fraturas ou lesões graves.
Márcio Leme atentou para o seguinte fato: o episódio revela a necessidade de que os alunos foquem não apenas nos estudos em si, mas também em seu estado emocional. Ou seja, cuidar da saúde mental e aprender a lidar com eventuais frustrações em um momento de cobrança e pressão intensas.
Os problemas de saúde mental têm se tornado cada vez mais comuns ao redor do mundo. A ansiedade, por exemplo, atinge mais de 260 milhões de pessoas. Inclusive, um relatório de 2017 da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontava o Brasil como o país com o maior número de pessoas ansiosas nas Américas, com 9,3% da população apresentando este quadro, o equivalente a 18,6 milhões de pessoas.
Já transtornos depressivos tinham sido relatados por 5,8% dos brasileiros, ou 11,5 milhões de pessoas.
E a situação ficou ainda pior nos últimos anos! Segundo uma pesquisa do instituto Ipsos, encomendada pelo Fórum Econômico Mundial e cedida à BBC News Brasil, 53% dos brasileiros declararam que o seu bem-estar mental piorou um pouco ou muito desde o início da pandemia de covid-19. O percentual só é maior em quatro países: Itália (54%), Hungria (56%), Chile (56%) e Turquia (61%).
Outro estudo, publicado pela Fiocruz em meados de 2020, dizia que “sentimentos frequentes de tristeza e depressão afetavam 40% da população adulta brasileira, e sensação frequente de ansiedade e nervosismo foi relatada por mais de 50% das pessoas”.
Sendo assim, é também papel das instituições de ensino a busca por modelos e dinâmicas que visem a contribuir com a manutenção da saúde mental dos alunos, dentro e fora da sala de aula.
Neste artigo, você verá como a sua instituição de educação superior (IES) pode ajudar a promover o bem-estar dos estudantes de Direito e o equilíbrio entre estudos, trabalho e vida pessoal.
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Saúde mental no curso de Direito
O estudo “Reflexos da covid-19 na saúde mental de estudantes universitários” indicou que, em Portugal, a pandemia afetou especialmente mulheres e estudantes dos primeiros anos de faculdade (entre 18 e 24 anos de idade), das áreas de Direito, Ciências Sociais e Serviços.
Os pesquisadores — das universidades de Lisboa, Porto, Minho e Algarve — entrevistaram 694 alunos, sendo que 50,6% deles indicavam sintomas de ansiedade moderados a severos. Um quarto (25,9%) teve sinais de depressão.
Uma das alunas entrevistadas para o estudo, Aline Sanches, comentou sobre os prejuízos no processo de aprendizado desencadeados pela pandemia. Para ela, Direito é um curso que exige prática e debates participativos. Contudo, muitos professores se limitavam a ler o que estava nos livros e barrar a participação dos alunos nas aulas online.
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Principais causas para problemas de saúde mental entre estudantes
Voltando à realidade brasileira, o estudo “Global Student Survey”, que ouviu 16,8 mil estudantes de 18 a 21 anos entre outubro e novembro de 2020, indicou o Brasil como o país com maior índice de universitários que declararam ter a saúde mental afetada na pandemia.
No país, a insegurança e a incerteza sobre o futuro são associadas como possíveis gatilhos para o estresse e a ansiedade apontados pelos jovens universitários.
A pesquisa mostrou, por exemplo, que 61% dos universitários ouvidos no Brasil afirmaram ter dificuldades para pagar as contas. A média era de 53% entre os demais países.
Entre os problemas financeiros:
- 40% afirmaram ter dificuldade para quitar serviços públicos (como água e luz);
- 25% alimentação;
- 25%, contas médicas;
- E 19%, aluguel ou hipoteca.
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Segundo o estudo, os três principais desafios que a atual geração irá enfrentar são:
- O aumento da desigualdade (34%);
- A dificuldade de ter acesso a empregos de qualidade (24%);
- Dificuldade de garantir a educação de todas as crianças (14%).
Mas, para além dos motivos apontados pela pesquisa, outros fatores que podem impactar a saúde mental dos estudantes:
- Expectativas com a instituição de educação: muitos alunos não têm ideia ou constroem em sua cabeça uma imagem totalmente destoante da realidade em relação à vida acadêmica. Assim, encontram dificuldades em se adaptar às mudanças na rotina e às cobranças do curso superior.
- Pressão do vestibular: em cursos concorridos, como o de Direito, a pressão vem antes mesmo da entrada na universidade. A etapa do vestibular exige grande esforço e dedicação, que podem abalar a saúde mental dos alunos antes do ingresso efetivo na faculdade.
- Frustração com o curso: há ainda os estudantes que não se identificam com o curso escolhido ou se decepcionam com as aulas. Neste caso, vale a IES realizar periodicamente pesquisas de opinião sobre os professores, cursos e disciplinas, a fim de ouvir as demandas e expectativas dos alunos.
Sinais de saúde mental abalada
Alguns sinais podem indicar que está na hora de avaliar a saúde mental. É importante falar sobre eles com os alunos da sua IES, ajudando-os a identificar quando é hora de buscar ajuda.
Naturalmente, alguns dos sintomas que serão apresentados a seguir podem aparecer de vez em quando e não necessariamente indicam problemas. Contudo, quando eles se tornam frequentes e afetam a rotina do aluno, um sinal de alerta deve se acender.
Entre estes sinais, estão:
- Problemas no sono: um adulto precisa dormir por um período de sete a nove horas por noite, e os distúrbios no sono são um dos primeiros sinais de doenças mentais. Eles podem envolver dormir demais ou sofrer com insônia e ser indicativos de quadros como ansiedade e depressão.
- Preocupação excessiva: viver preocupado e com medo constante, de forma que impacte as atividades do dia a dia, é outro indício de que algo precisa ser revisto.
- Alterações de humor: mudanças constantes de humor sem motivo aparente também podem indicar problemas ligados à saúde mental. Neste caso, é importante ficar atento ao reagir com muita irritação ou intensidade em situações que geralmente não trariam tanto desconforto.
- Sintomas físicos: diversos sintomas físicos também podem ser desencadeados por doenças mentais, como dores de cabeça, alterações intestinais, falta de ar, palpitação, sensação de dormência nos membros, queda de cabelo e alergia. Diante destes sinais, é preciso procurar um profissional de saúde para investigar as suas causas.
- Afastamento social: não sentir mais vontade de sair com amigos, estar perto de pessoas queridas ou receber visitas é outro sinal vermelho para problemas associados à saúde mental.
- Desânimo e cansaço: o cansaço acumulado ao longo da semana é bastante comum para quem tem uma rotina agitada. Mas vira um ponto de atenção se permanece, digamos, depois de um longo período de descanso. Junto ao cansaço crônico, também podem surgir o desânimo e desinteresse por atividades de que antes se gostava.
- Perda ou ganho de peso: enquanto a ansiedade costuma gerar picos de compulsão alimentar (em que a pessoa passa muito tempo sem se alimentar e depois come grandes quantidades de comida), a depressão geralmente causa perda de peso (é comum que os pacientes percam o interesse em se alimentar). Lembrando que tanto um caso quanto o outro devem ser avaliados por um profissional de saúde para um diagnóstico correto e o descarte de outros problemas de saúde.
- Dificuldade de concentração: raciocínio mais lento, piora na produtividade/gestão do tempo e dificuldade de processar informações como antes também precisam ser avaliados com cuidado, a fim de se identificar quadros de esquecimento e déficits de atenção.
Como promover um ambiente mais saudável?
Você já percebeu a importância de a sua IES ajudar os alunos a identificar questões ligadas à saúde mental. Mas talvez esteja se perguntando: quais ações práticas a instituição pode adotar para ajudá-los a se recuperar?
Aqui vão algumas dicas:
#1. Promover rodas de conversa sobre saúde mental
Rodas de conversa podem ser uma forma descontraída de desmistificar questões consideradas tabus pelo corpo acadêmico, como transtornos mentais.
Crie espaços na sua IES para que as pessoas se sintam seguras e acolhidas para compartilhar as suas emoções, preferencialmente mediados por um psicólogo ou profissional de saúde especializado.
A roda de conversa permite que os participantes se expressem e ouçam os demais sem julgamentos, tendo a possibilidade de identificar questões semelhantes às suas e encontrar acolhimento.
Este tipo de abordagem faz parte da Terapia Comunitária Integrativa (TCI), modelo proposto pelo médico psiquiatra Adalberto Barreto, que teve início no Ceará e hoje já alcança 26 países.
A ideia é trabalhar a escuta ativa, a empatia e a solidariedade, a partir da construção de redes sociais solidárias de promoção de qualidade de vida.
#2. Fornecer apoio psicológico
Algumas instituições de ensino oferecem serviço de atendimento psicológico gratuito à comunidade acadêmica, como uma atividade de extensão universitária para os cursos das faculdades de Psicologia.
Esta é uma maneira, inclusive, de contribuir com a formação dos alunos nos últimos anos do curso, que costumam realizar os atendimentos sob supervisão de psicólogos já formados.
Confira alguns exemplos de IES que oferecem esse tipo de suporte:
Universidade de São Paulo (USP)
O Instituto de Psicologia (IP) da USP presta diversos serviços de atendimento e práticas psicológicas que são públicos e gratuitos. Voltam-se tanto à comunidade da USP quanto ao público geral que frequenta o entorno da universidade.
Universidade Federal do Amazonas (Ufam)
Durante a pandemia, a Faculdade de Psicologia da Universidade Federal do Amazonas passou a oferecer atendimento virtual à população, e não apenas à comunidade acadêmica, com agendamento prévio por e-mail ou telefone.
#3. Estimular os alunos a criar e manter uma rotina
Estabelecer uma rotina equilibrada é chave para a manutenção da saúde mental. E a sua IES pode promover debates sobre a organização dos estudos e a criação de uma rotina que favoreça a saúde mental dos alunos.
Falar sobre a importância de uma boa alimentação, de descanso e de vida social e, mais do que isso, oferecer suporte aos alunos que estão com dificuldades de se organizar neste sentido é uma ótima maneira de a IES mostrar que é um espaço de acolhimento para os estudantes, concorda?
Bem, você viu neste artigo como é importante ajudar os alunos (especialmente em cursos que demandam tanta dedicação, como o de Direito) a manter uma boa saúde mental.
A sua instituição de ensino pode protagonizar diversas iniciativas para acolher a comunidade acadêmica nessas questões. Falando em comunidade, é preciso estar atento não só aos alunos, como também aos professores e demais profissionais que atuam na IES.
É muito comum, por exemplo, que exista nas IES a síndrome de burnout em professores.
Cuidar do bem-estar psicológico de todos deve ser uma das diretrizes da instituição, e é importante, inclusive, para a manutenção da sua qualidade e posicionamento de mercado.
Estudantes felizes com o curso, disciplinas, professores e acolhimento universitário tendem a se tornar porta-vozes da instituição de ensino e promovê-la entre o seu círculo de amigos e conhecidos.
Esperamos que tenha gostado deste artigo sobre a saúde mental no curso de Direito! Que tal conferir também nosso conteúdo sobre o acolhimento dos alunos?