Como sobreviventes em um mundo pós-apocalíptico, estudantes, educadores e profissionais da educação contabilizam perdas e ganhos que o ano de 2020 trouxe. Para além da crise sanitária, os ensinos básico e superior sofreram com desafios sem precedentes, sobretudo por conta do fechamento definitivo de salas de aulas e a migração repentina e desordenada para o modelo remoto de educação.
Quando a questão é acesso, o impacto é enorme e de longo prazo. Os dados da Organização Internacional do Trabalho confirmam essa conclusão: a pandemia negou estudo a 70% dos jovens entre 18 e 29 anos. A pesquisa entrevistou 12 mil jovens em 112 países. Entre os destaques do relatório, 51% dos entrevistados afirma que a crise vai atrasar a sua formação e 65% afirmaram que aprenderam menos.
Do ponto de vista docente, os desafios também são inúmeros. E suas dores são frequentemente as mesmas dos estudantes: faltam letramento digital, estrutura de internet de qualidade e conhecimento entre as ferramentas digitais necessárias para manter, no mínimo, o essencial dos compromissos letivos. Nessa tentativa de correr contra o tempo, e se adaptar ao on–line, muitos também viram suas jornadas de trabalho se alongarem. A pesquisa “Trabalho docente em tempos de pandemia”, feita com mais de 15 mil professores, apontou que para 82% deles houve aumento de tempo trabalhado, por conta da atuação remota (UFMG e CNTE).
Diante deste cenário, é possível dizer que a pandemia em 2020 acelerou o processo de transformação digital no setor educacional?
O voo das edtechs
Do ponto de vista dos negócios, as startups de educação tiveram o momento como um trampolim, impulsionando sua atuação. Segundo a Abstartups (Associação Brasileira de Startups), houve crescimento no número de empresas do tipo. A maior parte delas (70%) são do segmento de educação básica, que foca nos anos escolares de formação.
Entre serviços de capacitação de professores, aplicativos de conteúdo e leitura digital, há um consenso sobre a maior abertura à transformação digital em instituições de ensino, ainda que esta curva de implantação seja lenta.
O auge das videoaulas síncronas
Com a migração rápida para as aulas remotas, os aplicativos de chamadas de vídeo vivem um pico na quantidade de usuários. O Zoom experimentou um crescimento de 1123% ao longo da pandemia, impulsionado pelo home office implementado por diversas empresas do mundo todo, além de apoiar instituições educacionais e seus professores. Até maio de 2020, o uso do Microsoft Teams havia quadruplicado e em abril o Google Classroom já havia dobrado a quantidade de acessos de sua plataforma de disponibilização de conteúdo educacional.
EaD em alta
A modalidade de Educação a Distância já estava ascendente antes da pandemia. Em 10 anos (de 2009 a 2019) o número de estudantes do EaD aumentou quase 5 vezes. Foi um crescimento de 378,9% de matrículas neste segmento, de acordo com o Inep. Há inúmeros motivos que impulsionam a preferência por esse modelo, como a flexibilidade e o custo-benefício.
O panorama econômico resultante do cenário de covid-19 também influenciou nesse aspecto: com o desemprego em alta, há uma preocupação em manter os estudos, algo que ainda não pode acontecer presencialmente. Ainda que haja uma perda de renda, 94% dos estudantes manifestou que quer continuar estudando segundo pesquisa da ABMES (Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior) com a Educa Insigths.
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O ano de 2020 foi o ponto de virada?
Todos esses fatores demonstram que o processo de transformação digital na educação está em curso e não tem volta. Por outro lado, mesmo que a pandemia do novo coronavírus tenha acelerado a migração para modelos digitais, ainda há um longo caminho pela frente. As diversas dificuldades enfrentadas levantam inúmeras lições aprendidas.
A principal conclusão, endossada por especialistas da área, é a velha premissa de que quantidade não necessariamente implica em qualidade. Ainda que mais professores e estudantes tenham utilizado mais ferramentas digitais ao longo do turbulento calendário letivo, assegurar uma boa experiência de ensino e aprendizagem envolve inúmeras melhorias na aplicação desses recursos. Na maioria dos casos, não importa muito a tecnologia em si, mas o uso pedagógico que se faz dela.
Antes de mais nada, será preciso compreender como incorporar as tecnologias digitais nos projetos pedagógicos e planos de aula de modo permanente, e não como paliativos no contexto de pandemia. A implementação de ferramentas tecnológicas por si só não garante que os problemas e dores de educadores e estudantes tenham sido superados. E este é o verdadeiro ponto de virada: garantir que esses recursos digitais inovadores resolvam questões reais, colocando estudantes e professores no centro do debate.
Sobre este artigo
Para quem chega por aqui agora, aproveito a oportunidade para me apresentar: sou a Isabella Sánchez, especialista em Educação e Tecnologia aplicada à Educação pela Ufscar, com ênfase em Gestão da Educação à Distância e Produção e Uso de Tecnologia na Educação. Também sou formada em Letras pela USP e Comunicação Social (Jornalismo) pela Faculdade Cásper Líbero.
Atualmente gerencio os times de conteúdo das soluções digitais da Saraiva Educação e dos conteúdos de doutrina do selo editorial Saraiva Jur. Produzimos materiais pedagógicos para instituições de ensino superior e livros de Direito para estudantes, professores e profissionais jurídicos. Saiba mais aqui!
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